quarta-feira, 22 de abril de 2009

alívio nada imediato

Sair do inicial desespero inicia um ânimo novo. Era como se lhe soltassem as asas, encarnadas de sangue e marcas a ferro quente. Ainda havia dor, ainda não poderia voar por tempos, mas tinha já as asas livres. Embora não reparasse na corrente sinuosa que escorria de seu tornozelo sabia ainda estar longe de poder voar, não sabia estar a uma distância quase impossível. Como quisera sonhar com esse dia, mas antes que nascesse o dia o sonho e o sono é que eram impossíveis. O caminho para o trabalho durante aquela estada longínqua de quem lhe pressionava o peito havia mais peso. Eram tantas as pessoas que iam com ele, ao lado dele, lhe respiravam o ar. Ainda sim não o eram. Nem sequer eram a ela. Tampouco podiam sê-lo ou, antes, sê-la. Mesmo que duvidasse tanto de si mesmo ainda tinha essa certeza. E essa era a sua salvação. A salvação de um abismo no qual se jogara sem ter o conhecimento de suas asas presas. A olhar o mendigo ao lado torcendo-se de cólicas por provar uma coca-cola com o estômago vazio e cheio de vermes. E nesse seu suicídio, tão impetuoso e idiota quanto nos fazia rir o nosso tão amado cavalheiro da triste figura. Um idiota completo e impetuoso. Combinação magistral para tragédias ou triunfos, mas não digna de pequenos atos como o dos suicidas. Jamais saltaria desconhecendo a envergadura de suas próprias asas, porém não verificar a sabotagem que se aninhara em seus braços e inscrevera-se tal qual tatuagem em velhos marinheiros conhecedores dos mares do esquecimento para simplesmente dar-lhe o nó que o faria refém em queda livre. Ao olhar pra trás buscando a compreensão naquela figura que já tinha invadido suas narinas com o perfume cintilante das lanternas dos afogados e suas vidas não cumpridas vira somente a distância aumentando e a luminosidade daquele encanto se abrir em meio aos lábios envenenados de desejo. Quando já desacreditado então da possibilidade de regresso ao vôo, ou ao menos da planagem se lhe escapam os nós atadores das asas maltratadas. Há um vislumbre de despertar, os olhos entreabrem, é uma sensação tão maravilhosa abrir os olhos e poder ver, de novo, o veloz amanhecer.

(biel)

2 comentários:

Thais disse...

enfim achei o blog do baixista saltitante que pediu suco de laranja com mamão (e atrasou o brinde da cerveja).

Thais disse...

lábios envenenados de desejo..."

sem dúvidas a frase que mais me fez enxergar a mim mesmo...rs...
enxergar a si mesmo é o melhor modo de descortinar-se...
abram alas que tio Teco chegou ao seu blog e daqui não saio nunca mais! pois pra mim você já afz parte do meu show, meu caro.

primeiramente porque és divertido!

amplexos.