quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Em sua primeira vez

Ele
des
a
brochou...

(Gu)

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Primavera

Ela despontava, na manhã-de-cada-dia, ainda antes da derradeira estrelinha se despedir, com a mansidão das calmas ondas (as ondas também parecem-se calmas), preguiçosamente, apenas insinuando sorriso. Como quem só desabrochasse às mãos de lavrador já senhor.
Vinha, pois, alguinho exausta das remotas marinhas viagens. Atlanticamente, inundava o permeável pelos recantos. Vagarinhosamente, em slow-motion, em gotas lacrimais.
Guiado pelo mântrico canto dos passarinhos que lhe prestavam serenata a Ela, o Ele chegou na escola, na nublada manhã de final de ano e, sob as doces aves marinhas, desejou do profundo do coração um bom dia pra Ela. Límpido, gratuito, a granel. Claro que está que segredos toda gente encerra, entretanto Ele oferecia puramente uma tolice gostosa, uma ausência imprudente (por um {a}triz inventada) de madureza. Tangenciando a irritação, além da contemplação.
A estrelinha abençoou os meninos suspirosa e, enfim, seguiu para seu destino cósmico, para outras bênçãos.
Ele adivinhava os de-sertões pelos quais Ela atravessara no antanho. Até porque Ele há muitíssimo caminhava.
Todouvidos, Ele dispunha inteira sua audição para as parábolas d`Ela, quando que lhe foi segredado que havia dia que não existia. Sim, creiam!
Desatento que era, mal repararia que alguns dias não viriam à luz. A extensão às pessoas que não existiam não exigia largueza intelectual ou intuitiva, não obstante Ela alastrasse a ponte para Ele atravessar novamente.
Findaram por concordar que dia ora fabulado não existia.
Sem bastante acelerar, concluíram inclusive que era até possível conceder existência a tudo. Não que fosse roubar o fogo sagrado e pirulitar por aí fazendo e desfazendo. Nem almejavam tanto, queriam mais era aceitar entusiasmadamente o curso da natureza e convidar a participar do ciclo aconchegante o que estava (sem assim o desejar) deslocado na festa.
Navegando (pois que navegar é preciso) rumo às salas de aula, sem se aperceber, ultrapassaram-nas, bem como o tema da parábola. Tem coisa que não permite regresso, via sem retorno: se a gente lê um poema lindo (logo, perigoso), não dá pra desler depois; se a gente diz sim pra Iara, não dá pra voltar à tona, soltando das mãos dela. E não há Arnold Schwaznegger que volte!
Assim sendo, não puderam retroceder os passinhos serenos. Ela já sabia um pouco matar aulas, também que vida e morte são casadas e, por fim, que assistir diligente às aulas não ajudaria muito a existir nem nada. Ele aprendia repentinamente espantado tudo de única vez. Com o coração descompassado agitando o paupérrimo e cristal peitozinho. Como faminto há semanas desérticas, se servisse de um estendido banquete apressadamente, temeroso da súbita morte de seu corpo. Era possivelmente o pioneiro temor da morte.
Um-a-um passo a frente, o chão tremia... o chão já não existia
Ela rogava que Ele a conduzisse, todavia a gente e eles sabiam que, indicamente, Ela bussolava o norte d`Ele.
Percorreram pela escola intereoranamente, flutuavam com muita cautela pelos asfaltinhos, de enfim terra roxa.
Impossível a Ela calar a surrada memória dos tempos no Saara. Pisara com seus pezinhos ainda suaves pela primeira naquelas ardidas areias há quanto tempo? Em travessia de busca do seu amor. Quantas e quantas vezes não tombara de sede? Os cães rosnando com seus olhares de fogo. O sol fustigando a pele branquinha. E Ela sozinha. Aí já sem saliva para berrar, para sussurrar que fosse pelo seu amor.
E Ele beladormecido.
De espera uma vez, chorou copiosamente o que deveria beirar sete dias e meio e um quarto. Recuperou o que pode com suas mãozinhas de pianista e bebeu as lágrimas a fim de sustentar vindouros dias.
Irascível, num dia desses, de solavanco, assustadoramente solapando o que quer que estivesse pela frente, as retinas da nossa heroína frearam numa ventania desabrida. Ela era e é tão miudinha, magrinha – quem viu pode confiar comigo que sim, sem exageros. Se houve desigualdade algum dia na História, decerto que foi nesse enfrentamento. Ela, ciente de sua fragilidade, decidiu lépida se enterrar na areia. Quem não pode com seu inimigo, que se alie a ele - antrofagicamente.
Degradualmente, a presença do seu amor foi se tornando menos oásis e mais carne. Assim que ela pode ir se liquescendo, infinita e profunda, nas ondas que avançam pelas manhãs com a lerdeza de quem anda devagar porque já teve pressa.
Pois não é que agora os meninos defrontavam com uma das salas de aula, entrevada de toda, agasalhada por uma grossa cortina negra, não devia de nem trazer recordação do que fosse luz.
Sim, Ela sabia ler cartas de tarô, traçar mapas astrais, afagar as constelaçõezinhas muito afetuosamente e compreender não menos afetuosamente o afago oferecido por elazinhas em troca, nas enigmáticas respostas. Verdade que no deserto Ela só tinha as constelações por companhia, porém nem sempre suas relações foram as mais cordiais, não.
Diga-se de passagem: Ela mais Ele coincidiam em tudo em seus mapas astrais, exceto na lua.
Bem, Ela havia tirado a sorte do dia, conforme o de sempre, e quem a visitava então não era senão a temível Torre, em sua plena potência e esplendor: virtualizando a edificação e a implosão.
Concluíram que a sala não existia, claro. Quero dizer, escura, esbravejando total escuridão. Vacilaram um longo período. Entretanto, com as mãos e pés trêmulos, num ímpeto violentíssimo, os meninos adentraram na torre, pacificamente, considerando melhor mesmo deixar a sala existir.
Como primeira medida, após descerrar a porta, e simplesmente entrar (coisa que há tanto não deveriam ter a coragem de fazer), acenderam as luzes artificiais pelo interruptor. Como apenas limpassem as feridas, nada afoitos.
Logo após, curiosamente Ele já tomava a dianteira desde que deslumbraram a sala, caminharam até as janelas e desvelaram aquelas velhas cortinas conservadas que proibiam a vida. Desvelaram-na tremendo, deixando queimar com delicadeza e brandura o êxtase de alguma santidade, o fervor da bondade e da comunhão deslizando, escapando pelos sorrisos, pelos olhares brandindo. Deixando escapar. Com o poder do milagre latejando nas mãos, já podendo e curando.
O dia, como já disse, estava nublado, não foram muitos tampouco muito vivos os raios solares que invadiram a sala. Mas que importava? os raios agora eclodiam de dentro, como do fervilhar do centro da Terra.
Por fim, arrumaram com carinho e quase geometria as carteiras da sala, além de desenharem desenhos muito lindos e pueris pelo quadro negro. Creio que também escreveram versinhos, estou errado? Bom, assoprando a ferida. Colocando band-aid colorido.
Não sabiam. Era matutino por demais pra saber, todavia, naquela sala de aula solitária, limitada por concretos, eles haviam semeado, se assim me permitem dizer, com amor, uma filhinha.

(Gu)

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

show da vida

-acreditar chorando?
nãoposso
-eu vi o invisível e
ele tinha o seu rosto
-nãoposso
-mas vc estava lá
-não posso
-o show vai começar
-não...

(biel)

outra variação

Há abismos no caminho
todinho
Ver-te sua-visa o mundo.
Cansei de beijar o telefone depois que você desliga.

(biel)

variação de outro poema matutino

na manhã
bem-te-ví
não, não
fechei os olhos...
as borboletas.

(biel)